Meus sentimentos são a minha ruína. Não um vendaval que tudo arranca de súbito, mas uma maré persistente que, dia após dia, corrói as bases...

Ruína Silenciosa

 Meus sentimentos são a minha ruína.

Não um vendaval que tudo arranca de súbito,

mas uma maré persistente que, dia após dia,

corrói as bases frágeis onde me tento erguer.


Há mais de um ano caminho sobre estilhaços,

tentando manter-me de pé entre os poucos altos

e os muitos abismos silenciosos que me habitam.


Não sinto vontade de existir.

Queria voltar no tempo — não para mudar o passado,

mas para poder esquecer que já acreditei no futuro.

Resetar o coração, como quem apaga um quadro negro

e sonha, ainda que em vão, com a possibilidade de recomeçar.


Quero libertar-me desta aflição espessa

que começou como uma dor no peito,

mas que agora pulsa nos ossos,

sangra nos pensamentos,

sufoca os pequenos gestos do dia.


Os dias passaram a ser apenas horas a vencer,

o futuro um nevoeiro sem contorno,

e o presente um peso que se recusa a ser leve.


Tenho procurado forças — em olhares, em memórias,

em silêncios partilhados ou no eco das minhas próprias preces.

Mas tudo o que ouço é o sussurro constante

de uma vontade calma, quase serena, de partir.


Não por covardia.

Mas por exaustão.

Por não conseguir mais fingir que a alma respira

quando o peito vive em apneia.


Ainda assim, escrevo.

Porque talvez, nesta escrita, exista

um fio ténue de esperança.

Um pedido mudo para que alguém me leia,

e me veja inteiro — mesmo em pedaços.

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