Todos os dias, quando o relógio anuncia o fim do expediente, nasce em mim uma vontade imensa de ir para casa. Não é só o cansaço do corpo qu...

A estranha vontade de voltar para casa mesmo não tendo um lar

Todos os dias, quando o relógio anuncia o fim do expediente, nasce em mim uma vontade imensa de ir para casa. Não é só o cansaço do corpo que me empurra para a porta da saída, é uma ânsia, uma urgência quase primitiva por abrigo, por silêncio, por paz. Mas aí vem a pergunta silenciosa, teimosa, que me persegue entre o portão e a porta do carro: para onde eu vou voltar, afinal?


Não sei onde é o meu lar.


Lar é mais do que paredes, mais do que um sofá confortável ou uma cama feita. É mais do que um endereço fixo. Lar é onde se pode respirar fundo sem ter medo de ser julgado. É o lugar onde a alma se despe do peso do dia e encontra colo, mesmo em silêncio. E esse lugar, para mim, ainda é um mapa em branco.


Me sinto sozinha. Há uma solidão que não faz barulho, mas ecoa dentro de mim como um grito abafado. É o vazio que se instala quando não temos com quem dividir as pequenas vitórias do dia, os medos que disfarçamos com sorrisos, ou os sonhos que inventamos só para não desistir. No final do dia, não há ninguém à espera. Não há uma voz que pergunte o que aconteceu, nem braços que abracem só porque sim.


Me falta um espaço onde eu possa ser, simplesmente, eu. Sem máscaras, sem defesas, sem medo. Um lugar onde não precise explicar minhas pausas ou justificar meus silêncios. Onde eu possa contar as coisas boas com brilho nos olhos, ou apenas chorar sem precisar dizer porquê.


Talvez o lar seja isso: alguém que nos escute com o coração inteiro. Alguém que queira saber, mesmo quando não temos muito para contar. Alguém que esteja, não por obrigação, mas por querer estar. E enquanto esse alguém não chega — ou enquanto não me encontro dentro de mim mesma — sigo a caminhar por entre os dias, tentando descobrir onde é que me perdi.


E, quem sabe, onde é que vou me encontrar.

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